Mais um
Mais um conto de amor. Merda. Por mais que se esforçasse, ultimamente Wilson acabava sempre falando sobre paixões falhadas. Brigas conjugais. Amores platônicos. Merda, merda. Depois de duas linhas de diálogos retóricos entre a Marival e o Norberto, duas personagens recorrentes na sua parca imaginação, Wilson voltou a limpar a tela do computador. O branco hipnótico ajudava a esterelizar ainda mais a sua mente viciada.
"Não quero mais nada com você, Norberto!", era outra frase escrita, reescrita e não-escrita por ele. Queria escrever um suspense. Um amor, sim, mas que fosse sublimado por uma morte violenta. Um incesto. Talvez tiros na porta de uma joalheria.
Wilson não era um escritor policial. Já tentara entrar na literatura dos crimes, mas o máximo que havia conseguido era um romance medíocre que começava com um crime menor. Duzentos e trinta e quatro exemplares vendidos. Duzentos comprados por ele. Quem seriam as outras 34 pessoas? Leitores dos seus contos de amor que se sentiram traídos pela mudança? Fãs da literatura policial que ousaram acreditar no meu talento?
Os amigos de Wilson, no começo da sua carreira de escritor, haviam lhe recomendado que não pensasse nos seus leitores depois da obra acabada. Mas, poxa, quem vende 50 mil livros não pode pensar em todos, mas..trinta e quatro? Não conseguia imaginar meio Maracanã, mas lembrava dos 30 e poucos colegas do tempo da escola.
Na estante, seus dois livros mais vendidos: "Encontrei você na noite azul" e "Gota do meu suspiro" iluminavam o ser ar falhado como um neon. A campainha toca. Wilson se levanta para atender. Percorre o carpete encardido com chinelos leves num pé pesado. Procura as chaves. Campainha toca novamente. Chave na porta. Boa tarde.
Um casal de vinte e poucos anos, com um sorriso de jovens cristãos, segurava o primeiro livro de contos de Wilson debaixo do braço. Tímidos, ousam fazer a pergunta ao grande mestre do amor. Pode nos dar o seu autógrafo? O escritor hesitou, não poderia ser verdade. O casalzinho explicou. Nos conhecemos numa biblioteca, sabe? Cada um de nós estava lendo um livro seu..coincidência, não é mesmo? Casamos há dois meses.
Wilson escreveu o seu nome. Wilson Carrara. Quando fechou a porta para os sorrisos, respirou fundo e seus olhos abaixaram como um por-do-sol. Tinha que escrever algo novo. Nem que seja mais uma merda de um conto de amor.
"Não quero mais nada com você, Norberto!", era outra frase escrita, reescrita e não-escrita por ele. Queria escrever um suspense. Um amor, sim, mas que fosse sublimado por uma morte violenta. Um incesto. Talvez tiros na porta de uma joalheria.
Wilson não era um escritor policial. Já tentara entrar na literatura dos crimes, mas o máximo que havia conseguido era um romance medíocre que começava com um crime menor. Duzentos e trinta e quatro exemplares vendidos. Duzentos comprados por ele. Quem seriam as outras 34 pessoas? Leitores dos seus contos de amor que se sentiram traídos pela mudança? Fãs da literatura policial que ousaram acreditar no meu talento?
Os amigos de Wilson, no começo da sua carreira de escritor, haviam lhe recomendado que não pensasse nos seus leitores depois da obra acabada. Mas, poxa, quem vende 50 mil livros não pode pensar em todos, mas..trinta e quatro? Não conseguia imaginar meio Maracanã, mas lembrava dos 30 e poucos colegas do tempo da escola.
Na estante, seus dois livros mais vendidos: "Encontrei você na noite azul" e "Gota do meu suspiro" iluminavam o ser ar falhado como um neon. A campainha toca. Wilson se levanta para atender. Percorre o carpete encardido com chinelos leves num pé pesado. Procura as chaves. Campainha toca novamente. Chave na porta. Boa tarde.
Um casal de vinte e poucos anos, com um sorriso de jovens cristãos, segurava o primeiro livro de contos de Wilson debaixo do braço. Tímidos, ousam fazer a pergunta ao grande mestre do amor. Pode nos dar o seu autógrafo? O escritor hesitou, não poderia ser verdade. O casalzinho explicou. Nos conhecemos numa biblioteca, sabe? Cada um de nós estava lendo um livro seu..coincidência, não é mesmo? Casamos há dois meses.
Wilson escreveu o seu nome. Wilson Carrara. Quando fechou a porta para os sorrisos, respirou fundo e seus olhos abaixaram como um por-do-sol. Tinha que escrever algo novo. Nem que seja mais uma merda de um conto de amor.
Será que somos como Wilson pela vida afora?
Posted by CarolBorne | 10:46 PM